Toda projeção econômica, na sua capacidade de construir cenários de previsibilidade, começou a ficar comprometida a partir dos cenários e contextos da pandemia de Covid-19. Na atualidade, projeções se elaboram se prevendo que sua capacidade de outorgar confiança depende de circunstâncias externas ao mercado econômico e a variáveis próprias das atividades que lhe são próprias.
Entender o cenário econômico é essencial para estarmos preparados para o que virá no futuro. O que vemos na economia para 2023? Um mundo onde a inflação começa a perder força, mas que deve crescer pouco e onde o dinheiro ficou mais caro. No Brasil: eleições ficam para trás e devemos projetar o que virá com o novo governo.
Todos os anos faço uma projeção para o cenário econômico, e vamos lá ao ano de 2023. Conforme o cenário evolui, eventos acontecem, decisões políticas são tomadas, dados econômicos são divulgados, e essas projeções vão sendo refinadas, revisadas.
Onde estamos? Um mundo com menos inflação, mas menos crescimento.
Após um ano marcado por inflação recorde ao redor do mundo, a boa notícia é que começaremos o ano de 2023 com o pé fora do acelerador de preços. Ou seja, em um processo de desinflação global (lembre-se que desinflação é diferente de deflação! No primeiro caso, os preços ainda sobem, mas mais devagar).
Essa perda de fôlego nos preços é explicada por uma série de fatores. Primeiro, por conta da normalização da produção e do escoamento de produtos ao redor do mundo – que chamamos de cadeias de produção. Com países “de volta ao normal”, vimos custos logísticos caindo, como fretes, e o fim da escassez de produtos como microchips. Ao mesmo tempo, os preços de commodities pararam de subir e devem seguir relativamente estáveis ao longo de 2023 (mesmo que ainda altos para padrões históricos), segurando o custo de alimentos e insumos para produção de diversos bens. Finalmente, o processo de alta de juros implementado por Bancos Centrais ao longo de 2022 começa a fazer efeito – trazendo alívio aos preços, tanto por tornar o crédito mais caro, quanto por segurar as expectativas dos preços no futuro.
Porém, o outro lado da moeda da inflação que cai é o crescimento recuando. Afinal, juros mais altos têm o objetivo de frear a inflação, mas o efeito colateral é um freio na própria economia. Assim, a economia mundial deve crescer menos que a média dos outros anos, e países desenvolvidos como Estados Unidos e europeus devem enfrentar um período de recessão – mesmo que mais leve aos americanos, menos afetados pelo cenário ainda incerto de guerra entre Rússia e Ucrânia.
Enquanto isso, a China tentará reverter o baixo crescimento de 2022 com a flexibilização das medidas contra a covid-19, e pode puxar parte do crescimento global em 2023.
E o cenário para o Brasil?
Aqui no Brasil, 2022 foi um ano de crescimento econômico acima do esperado. Uma mistura de preços de commodities altos, com benefícios governamentais e demanda reprimida da pandemia impulsionaram o PIB no ano – que deve crescer 3,0% no dado a ser divulgado em março do ano que vem.
Porém, o ano de 2023 deve ser mais desafiador, e os dados já sinalizam nessa direção. De um lado, o setor de serviços – responsável por 70% do nosso PIB – já perde força, e deve deixar de impulsionar a economia como fez ao longo de 2022, na onda da normalização do consumo pós pandemia e da recuperação do emprego.
Na mesma linha, a redução de impostos que ajudaram a “liberar” parte da renda disponível das famílias, assim como os programas fiscais,ou perderão a validade em 2023 ou já estarão incorporados ao orçamento das famílias – não surtindo o mesmo efeito no consumo.
Já do outro lado, o efeito da manutenção da Selic em patamar elevado (em 13,75% ao ano) deverá seguir “freando” a economia. O comércio, por exemplo, já mostra claros sinais de enfraquecimento, especialmente de bens de consumo duráveis. Afinal, os juros altos pesam sobre o endividamento e – consequentemente – sobre o consumo de itens que exigem maior financiamento, como carros, móveis e eletrodomésticos. Esse movimento deve ganhar força em 2023, impactando também o emprego, o consumo de serviços e a produção industrial do país. A incerteza vinda do cenário político-fiscal doméstico ajuda a explicar o porquê de a Selic seguir alta em 2023, assim como o mundo crescendo menos também deve prejudicar nosso crescimento por aqui.
Porém, ainda vemos a economia brasileira crescendo 1,0% em 2023, puxada pelo bom desempenho de setores menos sensíveis à desaceleração da economia doméstica, como o agropecuário.
A inflação segue perdendo força no país. Após o IPCA (nosso principal indicador de inflação ao consumidor, terminamos o ano com inflação em 5,79% – ainda acima da meta do nosso Banco Central, mas já trazendo substancial alívio para o orçamento das famílias e empresas.
Com as várias altas da taxa Selic ao longo de 2021 e 2022 o Copom (nosso comitê de política monetária) manteve a taxa Selic inalterada em 13,75% a.a. em sua última reunião do ano, em dezembro- 2022, que deve se manter este ano sem muitas oscilações.
Deste modo, seguimos cautelosos com o cenário de inflação no Brasil para os próximos anos – o que não significa que vemos um cenário de inflação espiral nos próximos anos, projetando um patemar de 5,4% no IPCA para 2023.
Dra. Marcia Cezar Gadea
Ecnomista - Doutora em Ciências Sociais. Com estágio de doutorado na University of Leipzig - Alemanha
Especialista em Economia Comportamental.
Diretora de Recursos Humanos na Prefeitura de Canoas - RS